MOVIMENTO ZEITGEIST EM PORTUGAL

MOVIMENTO ZEITGEIST EM PORTUGAL

“Toda a indústria da propaganda e a sociedade de consumo entrariam em colapso se as pessoas se tornassem iluminadas e deixassem de tentar encontrar as suas identidades através dos objectos.” 

– Eckhart Tolle

GERMINAL. Emile Zola. Filme

ATENÇÃO: para ativar a legenda, é preciso clicar na sigla CC na parte inferior da tela.

O filme, baseado na obra da literatura francesa naturalista de Émile Zola, um clássico, retrata o processo de gestação e maturação de movimentos grevistas e de uma atitude mais ofensiva por parte dos trabalhadores das minas de carvão do século XIX na França em relação à exploração de seus patrões. Debate importante sobre as condições sociais dos trabalhadores em plena consolidação do capitalismo industrial na Europa e o processo de alienação e exploração de trabalho.

Direção: Claude Berri 
Ano: 1993 
País: Bélgica, Itália, França 
Gênero: Drama 
Duração 170 min. / cor
Título Original: Germinal

CAPITALISMO GLOBAL, PROLETARIEDADE E OS LIMITES DA INDIGNAÇÃO. Giovanni Alves

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[Publicado originalmente no Blog da Boitempo – http://boitempoeditorial.wordpress.com/2012/03/05/capitalismo-global-proletariedade-e-os-limites-da-indignacao/]

Nos primórdios do século XXI, torna-se cada vez mais visível, numa perspectiva histórico-mundial, o que Karl Marx e Friedrich Engels salientaram em A ideologia alemã, como sendo a grande massa da humanidade “destituída de propriedade” que está em contradição (e não apenas em contraste) com um mundo existente de riqueza e cultura, o que pressupõe, portanto, um grande aumento da força produtiva e um grau elevado do seu desenvolvimento. É por isso que, nas condições do capitalismo global e da crise estrutural do capital, coloca-se, objetivamente, de modo mais pleno, a necessidade histórica do comunismo como condição irremediável da emancipação de indivíduos histórico-mundiais de sua alienação radical das condições da vida social.

A grande massa da humanidade “destituída de propriedade” é constituída hoje pela multidão de proletários. Como diz o lema do movimento social Occupy nos EUA, “we are the 99%”. No plano categorial, a grande massa da humanidade alienada do controle social representa hoje a “classe” social do proletariado: “classe” com aspas tendo em vista que, apesar de estarem subsumidos à condição de proletariedade, só tornam-se efetivamente classe social – sem aspas – na medida em que aparecem, com maior ou menor efetividade, como sujeito histórico em si/para si.

Portanto, no sentido radical, “proletário” é o homem ou mulher destituído da propriedade dos meios de produção da vida social, isto é, alienados do controle social e imersos na condição existencial de proletariedade e não apenas o pauperou trabalhadores assalariados miseráveis com ampla prole. Por exemplo, o conceito de proletariado abrange hoje as camadas médias assalariadas que podem ser consideradas proletários de “classe média”. Deste modo, a dita crise da “classe média” que ocorre no capitalismo global expressa tão somente hoje, no plano contingente, a ampliação e explicitação, no plano da percepção social, da condição de proletariedade das camadas médias assalariadas (o que não significa que tenham se tornado membros da classe social do proletariado tendo em vista os obstáculos efetivos à constituição da consciência de classe nos segmentos médios do proletariado).

O crescimento das novas camadas médias de jovens proletários assalariados mais qualificados, desempregados ou inseridos em contratos de trabalho atípicos ou precários e que compõem hoje, principalmente nos países capitalistas mais desenvolvidos, o mundo do trabalho do século XXI – o dito “precariado” – é expressão suprema, no plano histórico-mundial, da explicitação da condição de proletariedade. Ela representa hoje a contradição candente do capital em sua etapa de crise estrutural. De fato, os jovens proletários carregam, em si, inscritos no seu ser, como estigma geracional, as desmedidas negativas do sistema produtor de mercadorias, que, por um lado, destitui homens e mulheres de propriedade e controle da vida social, e, por outro lado, ao mesmo tempo, acumula e concentra imensa riqueza e cultura.

A ampliação da condição de proletariedade do “precariato” ocorre, pari passu, com o incremento da manipulação que nega, no plano da percepção e do entendimento dos indivíduos históricos mundiais, a auto-consciência de classe. A invisibilidade social da natureza de classe do “precariato” é o processo ideológico supremo do capitalismo manipulatório. Na medida em que se ampliam as contradições vivas do capital, impulsiona-se com intensidade, a desefetivação humano-genérica, isto é, a precarização dos sentidos humanos capazes de “negação da negação”. Um dos alvos privilegiados da manipulação social são hoje, os jovens proletários mais qualificados que carregam em si e para si, a contradição suprema do capital em sua fase de crise estrutural.

A problemática geracional dos jovens proletários diz respeito não apenas a delimitações etárias, mas ao modo de controle do metabolismo social do novo proletariado hipertardio nas condições do capitalismo manipulatório com seu complexo de obstáculos efetivos à constituição da consciência de classe e, portanto, à constituição da classe social do proletariado como sujeito histórico efetivo capaz de “negação da negação”.

Nos países do capitalismo central, a temporalidade histórica dos “trinta anos perversos” (1980-2010) provocou cortes geracionais significativos no plano sociometabolico da “classe” do proletariado. Aceleração da mudança tecnológica na produção e no consumo, reação política neoconservadora e precariedade laboral com implosão dos laços de solidariedade de classe, projetaram as novas gerações de homens e mulheres proletários noutra dimensão sócio-histórica. A nova dinâmica sociometabolica do capital provocou segmentações inter-geracionais caracterizadas por clivagens na experiência vivida e experiência percebida de formações etárias da classe trabalhadora.

Na verdade, o novo modo de controle sociometabolico do capital operou fraturas salientes na experiência do tempo social. Eric Hobsbawn, no livro A era dos extremos, observou o fenômeno da “presentificação crônica”. Diz ele: “A destruição do passado – ou melhor, dos mecanismos sociais que vinculam nossa experiência pessoal à das gerações passadas – é um dos fenômenos mais característicos e lúgubres do final do século XX. Quase todos os jovens de hoje crescem numa espécie de presente contínuo, sem qualquer relação orgânica com o passado público da época em que vivem.” Por exemplo, as mutações sociometabolicas no seio do jovem proletariado é perceptivel no movimento estudantil dos países capitalistas mais desenvolvidos cuja tradição da contestação social não é reconhecida hoje pelos próprios estudantes. Na verdade, a falta de informação e de diálogo com gerações anteriores é hoje caracteristica comum a movimentos estudantis de todo o mundo.

Os fenômenos sociais da destruição do passado, presentificação crônica e falta de informação e de diálogo com gerações anteriores, isto é, alienação do passado público da época em que vivem – que se torna mais perceptivel com vigor, por exemplo, nas experiências dos movimentos estudantis – constituem expressões candentes do novo modo de controle sociometabolico do capital baseado  na precarização dos sentidos humanos capazes de “negação da negação”. Trata-se de um modo de dessubjetivação de classe que opera a obstaculização à formação da consciência de classe e por conseguintes, da própria classe social do proletariado como sujeito histórico efetivo capaz de “negação da negação”.  

Nos primórdios do século XXI, o novo (e precário) mundo do trabalho é constituído pelo amplo contingente de “jovens adulto-flexíveis”, conceito utilizado por Renan Araújo para denominar o contingente dos novos trabalhadores assalariados que ingressam nos novos locais de trabalho reestruturados na década de 2000. No plano da consciência contingente de classe, os jovens adulto-flexíveis (ou melhor, jovens-adultos toyotizados), empregados ou desempregados, estáveis ou precários, são portadores do que podemos denominar o “paradoxo de Ícaro”: 

Por um lado, enquanto jovem operário ou empregado inserido na relação de contrato de emprego estável, sente-se insatisfeito com a pressão do ambiente do trabalho flexível e suas contrapartidas salariais; sente-se frustrado com a realização profissional e insegurança laboral marcada pela pressão do capital pelo cumprimento de metas e desempenho (o ideal de ganhar a vida para perde-la repõem-se no patamar do toyotismo). Como observa Renan Araújo, “após anos de dedicação aos estudos e de profissionalização permanente, para a maioria a profecia não se cumpriu. Assim, deparamos-nos com engenheiros apertando parafusos, operários formados em Administração de Empresas operando torno CNC e outros que, mesmo tendo cursado Ciências da Informática, passam o dia clicando em softwares que, previamente programados, esvaziam o conteúdo do trabalho, deixando-o sem sentido, repetitivo e enfadonho. Por todos os ângulos em que se observa, a fábrica aqui pesquisada representa o mundo contraditório da promessa e da negação”. 

Por outro lado, enquanto jovem operário ou empregado inserido em contratos de trabalhos precários ou desempregados, sente-se insatisfeito pela exclusão do universo do emprego estável e flexível no sentido do que ele representa para as individualidades pessoais de classe: primeiro, capacidade aquisitiva para consumir e tornar-se “cidadão do mundo das mercadorias”. Segundo, carreira profissional com perspectiva de futuridade (ele sente profunda angústia pela desrealização do valor corporificado na força de trabalho como mercadoria e talento singular). Terceiro, capacidade de organização da vida pessoal, constituindo família e tendo seu próprio território de desenvolvimento humano.

Na medida em que a nova geração de empregados e operários mais qualificados, jovens proletários estáveis ou precários nasceram “órfãos” das utopias coletivas do sindicalismo de classe ou da adesão à militância política socialista, tornaram-se mais dispostos a concertação social, com atitudes pró-ativas de cariz liberal. Foram produzidos no horizonte do mercado, pré-dispostos em si e para si, a colaborarem com o capital. Por isso, trata-se de pessoas humanas com um acervo de sonhos, expectativas e utopias de mercado avantajadas, mas irremediavelmente frustradas pela dinâmica férrea da relação-capital que perpetua a precariedade laboral quase como “destino”. A ambiguidade e ambivalência diante dos valores burgueses são marcas pessoais indeléveis destes jovens proletários imersos no paradoxos de Ícaro (o sentimento de ansiedade e frustração traduz no plano pessoal, a imagem mitológica da derrelição de Ícaro).               

Nesse caso, temos a clara percepção da dialética do processo de subsunção do trabalho ao capital que “captura”, não apenas para controlar, mas para expropriar/espoliar o talento singular da nova geração de empregados e operários. Na medida em que o desenvolvimento do processo de acumulação do capital ocorre pari pasu ao processo de desenvolvimento civilizatório como pressuposto negado, ele explicita a operação de espoliação de riqueza intangível dos novos talentos humanos empregados na produção do capital.

Ora, temos, deste modo, ao mesmo tempo, espoliação e desperdício, tendo em vista que a relação-capital não desenvolve (e nem pode desenvolver) de forma integral, as possibilidades criativas da nova força de trabalho complexa. Trata-se de segmento da força de trabalho como trabalho vivo altamente qualificada no plano da competência técnico-científica, cuja frustração decorre da irrealização profissional e desperdício existencial de suas possibilidades humano-genéricas.

Estas novas gerações de proletários vivem à exaustão, a disjunção pessoa-classe que caracteriza o modo de controle sociometabolico do capital. Portanto, eis a problemática do estranhamento que assume hoje dimensões cruciais sob o capitalismo global. Para György Lukács, o fenômeno do estranhamento, ocorre na medida em que o desenvolvimento das forças produtivas sociais do trabalho ou da capacidade humana em reduzir as barreiras naturais, não significa o desenvolvimento da personalidade humana, mas pelo contrário, seu aviltamento e dilaceração em virtude da manipulação de alta intensidade e amplitude que caracteriza o capitalismo tardio.

Sob o capitalismo global, os jovens proletários mais qualificados, empregados ou desempregados, estáveis ou precários, tornam-se hoje objetos privilegiados de “captura” da subjetividade do trabalho pelo capital, sendo expostos de modo candente à manipulação pelo capital no plano das experiências expectantes, isto é, experiências que organizam (ou manipulam) anseios, expectativas e utopias pessoais.  

O traço estrutural do capitalismo global é a manipulação da subjetividade do homem-que-trabalha. Por isso, o capitalismo global, ou seja, o capitalismo histórico na fase de crise estrutural do capital, é essencialmente o capitalismo manipulatório. A exacerbação da dimensão manipulatória do capital decorre da própria natureza da dinâmica de acumulação capitalista.

No século XX, a produção de mais-valia relativa assumiu dimensões alucinadas. Por exemplo, com o fordismo-taylorismo, a produção em massa, que caracterizou o capitalismo monopolista do século passado, significou a necessidade candente do capital de realização da massa de mais-valia acumulada. Tornou-se crucial, mais do que nunca, vender as mercadorias produzidas pela grande indústria. Por isso, impõe-se a centralidade da manipulação, não apenas do trabalhador assalariado na produção, mas do consumidor na esfera do mercado. É necessário manipular à exaustão a subjetividade do trabalhador assalariado como produtor e consumidor.

É claro que, desde as suas origens históricas, o capitalismo industrial buscou realizar, por meio da venda das mercadorias, a mais-valia extraída nas fábricas. Para isso, constituiu-se, como necessidade íntima do capital em processo, o mercado mundial. Mas, na medida em que se desenvolveu a grande indústria, a necessidade de realização da massa de mais-valia relativa extraída na produção do capital, a venda dos produtos-mercadorias no mercado mundial, tornou-se uma estranha obsessão que delineou o sociometabolismo do capital do século XX e XXI.

O mandamento supremo do capital como “sujeito automático” de autovalorização do valor é acumular, acumular e acumular. Com a grande indústria e a produção da mais-valia relativa, para que o capital possa acumular, acumular e acumular cada vez mais, tornou-se, mais do que nunca, imperativo vender, vender e vender. A ânsia da vendabilidade universal elevou-se à enésima potência com a produção em massa e a constituição plena do mercado mundial no sentido da intromissão da forma-mercadoria na vida cotidiana da sociedade burguesa. A vigência da produção da mais-valia relativa colocou como pressuposto da própria realização do valor, o imperativo da venda no centro dinâmico da vida social.

A ampliação do círculo da vendabilidade universal significou no século XX, o domínio crucial do fetichismo da mercadoria no plano das relações humanas e sociais. David Harvey, em seu livro O enigma do capital, recém-publicado pela Boitempo Editorial no Brasil, observou que a obsessão do capital é saber onde aplicar o excedente de capital-dinheiro. É a volúpia do excedente disponível para valorização que caracterizará o metabolismo social do capital no século XX. A obsessão do possuídor da massa de capital-dinheiro imprimirá a sua marca na dinâmica social. Aliás, os fenômenos históricos cruciais do século passado – imperialismo e globalismo, ou ainda, a hipertrofia do sistema de crédito e financeirização – originam-se, em última instância, da volúpia de vendabilidade universal tendo em vista a realização da massa crescente de mais-valia relativa extraída na produção do capital.

O desenvolvimento das forças produtivas sociais do trabalho no século XX, com a vigência da lógica produtivista do taylorismo, fordismo e toyotismo, significou a elevação à enésima potência, da ânsia de realização da massa de mais-valia contida na imensa quantidade de mercadorias que compõem a sociedade burguesa, principalmente com o surgimento da produção em massa. A obsessão pelo consumo oculta, não apenas a obsessão pela absorção do excedente, como salientou Harvey, mas a obsessão pela realização do valor nas condições do mercado mundial constrangido.

Portanto, a contradição suprema do capitalismo histórico não é apenas produzir mercadorias, mas sim, realizar o valor contido nelas. That´s the problem! Por isso, as estratégias orgânicas do sistema mundial do capital no século XX buscaram administrar a contradição crucial, inovando na capacidade de prolongar à exaustão, as alucinações da forma-mercadoria, seja em torno da mercadoria propriamente dita, com a aceleração do circuito de valorização (produção, circulação e consumo, afirmando-se o que István Mészáros denominou “lei tendencial de decrescimento da utilização do valor de uso”); seja em torno da “mercadoria das mercadorias” (o Dinheiro), com a hipertrofia do sistema de crédito e a constituição do circuito da valorização fictícia (a financeirização da riqueza capitalista).

Uma das estratégias de administração da crise orgânica da forma-mercadoria, com impacto direto na morfologia social da sociedade burguesa e na subjetividade do homem-que-trabalha, é a manipulação do consumo. A manipulação da produção que caracteriza a grande indústria desdobra-se em produção da manipulação no plano da totalidade social. Eis um traço de alteração da alienação capitalista que caracterizará a “captura” da subjetividade do homem que trabalha pelo capital. Trabalhador assalariado é consumidor, onde o “é” acusa um juízo de devir (Trabalhador assalariado “torna-se”/interverte-se em consumidor). Na verdade, a vigência da manipulação sistêmica põe efetivamente o problema do estranhamento.

Sob o capitalismo, o problema da alienação é reposto, de forma ampla e candente, noutro patamar existencial, através do problema do estranhamento. Um mundo pleno de mercadorias é, segundo György Lukács, um mundo pleno de manipulação, que penetra não apenas os poros da produção, mas também do consumo e da reprodução social.

Se, por um lado, com a elevação do padrão de vida e consumo da classe trabalhadora no século XX, a percepção da exploração capitalista e o problema da alienação no sentido originário tendem a se esmaecer, por outro lado, põem-se, de modo incisivo, segundo Lukács, o problema do estranhamento propriamente dito, que, para ele, é o problema da vida plena de sentido (o psicanalista austriaco Viktor Frankl salienta que o problema crucial do nosso tempo é o problema da busca de sentido da vida).

Lukács observou, em 1968, que a mudança estrutural no caráter da alienação coloca, de forma candente, no auge do capitalismo afluente (o capitalismo fordista-keynesiano),  novas exigências no plano da luta de classes. Ou ainda, novas exigências no plano da consciência contingente de classe, expressa pela nova geração de empregados e operários mais qualificados (por exemplo, os “jovens adulto-flexíveis” ou toyotizados) que cresceram no interior do mundo de mercadorias e que possuem outras exigências, no plano do carecimento, comparados, por exemplo, com a geração anterior de operários e empregados. Diz Lukács:

“A luta de clas­ses no tempo da mais-valia absoluta estava voltada para a criação das condições objetivas indispensáveis a uma vida deste gênero. Hoje, com uma semana de cinco dias e um salário adequado, podem já existir as condições indispensáveis para uma vida cheia de sentido. Mas surge um novo problema:aquela manipulação que vai da compra do cigarro às eleições presidenciais ergue uma barreira no interior dos indivíduos entre a sua existência e uma vida rica de sentido. Com efeito, a manipulação do consumo não consiste, como se pretende oficialmente, no fato de querer informar exaustivamente os consumidores sobre qual é o melhor frigorífico ou a melhor lâmina de barbear; o que está em jogo é a questão do controle da consciência. Dou apenas um exemplo, o ‘tipo’ Gauloises: apresenta-se um homem de aspecto ativo e másculo, que se distingue porque fuma os cigarros Gauloises. Ou ainda, vejo numa foto de publicidade, não sei se de um sabonete ou de um creme de barbear, um jovem assediado por duas belas garotas, por causa da atração erótica que determinado perfume exerce sobre elas”.

Vimos que Lukács, adotando uma perspectiva histórico-ontológica, faz a conexão íntima entre mais-valia relativa e manipulação, no sentido de que a exploração pela mais-valia relativa propiciou, a um contingente organizado da classe trabalhadora, semana de cinco dias e salário adequado, isto é, condições objetivas indispensáveis para uma vida cheia de sentido. Segundo Lukács, objetivamente o proletariado possui hoje, pelo menos o proletariado estável, condições materiais para uma vida plena de sentido que entretanto, não se realiza, por conta da manipulação social que impregna a vida burguesa. O capitalismo da grande indústria de produção em massa tende, nas palavras dele, a erguer no interior desses individuos, “uma barreira entre a sua existência e uma vida rica de sentido”. Diz ele que a fruição da vida é reduzida ao gozo do consumo alienado. A ânsia fugaz pelo consumo de mercadoria é incapaz de dar um sentido à vida. Eis o sentido do estranhamento na ótica lukacsiana: o descompasso entre a existência dos indivíduos e uma vida plena de sentido

Portanto, para Lukács, o problema do estranhamento diz respeito em grande medida, à questão do controle da consciência, alvo-chave da manipulação do consumo visando a venda das mercadorias e a realização da mais-valia. A manipulação se ergue no interior dos indivíduos, cuja ânsia pelo consumo é instilada pelos aparatos de marketing e propaganda, como uma finalidade em si mesma. Diz ele:

“Por causa desta manipulação, o operário, o homem-que-trabalha, é afastado do problema de como poderia transformar seu tempo livre em otium, porque o consumo lhe é instilado sob a forma de uma superabundância de vida comfinalidade em si mesma, assim como na jornada de trabalho de doze horas a vida era ditatorialmente dominada pelo trabalho”.

A perspectiva de Lukács prende-se à produção capitalista fordista-taylorista quando o controle da consciência de classe, inclusive na construção do consentimento à produção rígida da linha de montagem acoplada a esteira mecânica, tinha no consumo, pelo menos para a classe operária organizada, seu lastro de legitimidade. O compromisso fordista-keynesiano, que caracterizou, nos países capitalistas centrais, os “trinta anos dourados” do capitalismo histórico do século XX (1945-1975), eram baseado na capacidade do capital em promover a “cidadania do consumo” em torno do ideal do emprego. A própria formação das individualidades pessoais de classe ocorriam com a elaboração de expectativas, anseios e utopias da carreira profissional e inserção laboral capazes de permitir a obtenção de capacidade aquisitiva, não apenas para satisfazer as necessidades básicas, mas os carecimentos sociais do admirável mundo novo das mercadorias.

Sob o capitalismo fordista-keynesiano nas condições da sociedade industrial afluente do pós-guerra, a fruição da vida era reduzida ao gozo do consumo de mercadorias. Nesse caso, a auto-consciência da alienação não se manifestava efetivamente, tendo em vista a vigência da “consciência tranquila” do operário ou empregado, que fruia a sua vida pessoal como individualidade de classe por meio do consumo estranhado. Na verdade, o trabalhador assalariado não se sentia insatisfeito no consumo, mas sim, na produção, tendo em vista a vigência do fordismo-taylorismo com a linha de montagem acoplada a esteira mecânica (a crise da organização do trabalho taylorista-fordista).

Com o capitalismo global de cariz neoliberal e a crise estrutural do capital, ocorreu a implosão do compromisso fordista-keynesiano baseado no crescimento com indexação de salários a produtividade. Nos “trinta anos perversos” (1980-2010), a crise do Estado de Bem-estar social, a crise do emprego e a ampliação da precariedade salarial ameaçou e frustrou as expectativas de consumo dos trabalhadores assalariados, principalmente das camadas médias asssalariadas que construíram suas expêriencias expectantes na perspectiva da fruição do consumo estranhado (eis uma dimensão da crise da “classe média”). Deste modo, percebe-se de modo claro, a corrosão do lastro de compatibilidade entre capitalismo e bem-estar social no núcleo orgânico do sistema mundial do capital. Ao mesmo tempo, intensificou-se e ampliou-se, de modo exacerbado, a manipulação da vida social, tanto no consumo, quanto na produção de mercadorias com a vigência do espírito do toyotismo.

Portanto, a crise do capital, que se instaurou em meados da década de 1970, opera descontinuidades/continuidades na dinâmica da manipulação sistêmica, repondo o círculo da alienação/estranhamento do homem-que-trabalha. A “captura” da subjetividade do trabalho pelo capital assume novas dimensões no sentido da constituição/explicitação de novos fenômenos da alienação/estranhamento. O “paradoxo de Ícaro” que atormenta os “jovens adultos-flexiveis” do mundo social do capital pode ser expresso do seguinte modo:

Por um lado, para os jovens trabalhadores assalariados do novo mundo do trabalho inseridos em contratos de emprego estável, a auto-consciência da alienação e insatisfação que caracterizava a organização fordista-taylorista do processo de trabalho, interverteu-se, com a organização toyotista, em estranhamento no sentido da fruição perversa e opaca que a condição de empregado estável na empresa flexível imputa aos homens e mulheres que trabalham submetidos ao cumprimento de metas desumanas e pressões contínuas por mais produtividade. Nesse caso, a carga de ansiedade e depressão deriva da realização profissional estranhada que dilacera seu ser humano-genérico.

Por outro lado, para jovens trabalhadores assalariados precários e desempregados, o dito “precariato”, “órfãos” da cidadania salarial, o sentimento de insatisfação e a auto-consciência da alienação se tornou crucial (alienação como perda/frustração). Nesse caso, existe uma sutil distinção categorial entre alienação e estranhamento. No plano da consciência contingente, o dito “precariato” sente-se alienado da “cidadania do consumo” e portanto, alienados de si mesmos como consumidores ou individualidades de classe constituídos no interior do mundo das mercadorias (nesse sentido, a alienação no sentido categorial tem uma intensa carga de insatisfação e deriva pessoal). Nesse caso, a carga de ansiedade, depressão e frustração compõem um quadro de desrealização íntima em si e para si que deriva da sua precariedade salarial no mundo das mercadorias.

Portanto, jovens-adultos assalariados, empregados e desempregados, estáveis e precários, representam dimensões paradoxais da classe-que-vive-do-trabalho com seus respectivos pressupostos sociometabólicos: por um lado, uma parte da classe que tem condições objetivas para uma vida plena de sentido, não consegue tê-la, tendo em vista o trabalho estranhado (a fruição perversa não está apenas no consumo, mas também no trabalho flexível). Mas na medida em que se constitui o círculo do estranhamento (consumo e trabalho estranhado), implode-se a “consciência tranquila” observada por Herbert Marcuse na época do capitalismo afluente. Na verdade, a exacerbação do estranhamento que assistimos no capitalismo toyotista constitui uma “consciência intranquila”, opaca e intransparente da sua condição de proletariedade. 

Por outro lado, outra parte da classe, constituída pelos trabalhadores assalariados precários (precários no sentido de alienada da “cidadania salarial”), sentem-se afligidos por não terem condições objetivas para uma vida plena de sentido. Eles representam a nova pobreza do capitalismo global de cariz neoliberal. No plano contingente, anseiam (e lutam) pela “cidadania salarial” nos marcos da ordem da mercadoria. Entretanto, as condições de luta e organização sindical, no plano do em-si da classe, são adversas para eles.

A “consciência intranquila” dos precários “indignados” do século XXI se distingue radicalmente da “consciência intranquila” dos proletários da Primeira Revolução Industrial que enfrentaram a experiência do factory systeminseridos ainda em modos de sociabilidades tradicionais e valores de cunho comunitário (como observou E.P. Thompson). Ora, os proletários precários pós-modernos nasceram e cresceram no interior da ordem social da mercadoria. Eles próprios sentem-se, no plano da consciência contingente, como mercadorias vivas. É o que explica, por exemplo, a incapacidade dos precários indignados traduzirem o sentimento de indignação numa perspectiva crítica para além da ordem burguesa. Na verdade, a indignação do “precariato” é a indignação reativa que decorre da frustração das expectativas, anseios e utopias de mercado (diferentemente, por exemplo, dos sonhos, expectativas e utopias das primeiras gerações de operários que possuíam sentido comunitário exterior à ordem industrial originária. De certo modo, eles ansiavam tornarem-se “produtores autonomos”, voltar a terra etc).

Na medida em que o capitalismo global não consegue repor a perspectiva de emprego digno para todos, os jovens “precários” alienados do sonho do emprego estável tendem a serem manipulados com o ideal da empregabilidade no sentido de construírem a identidade do “trabalho autônomo” ou “trabalho por conta própria de segunda geração” (como diria Sergio Bologna). Deste modo, a intranquilidade da descartabilidade se interverte na intranquilidade da fluidez, eufemismo para inseguraça, expondo, com vigor, a sua condição de proletariedade.  

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O livro mais recente de Giovanni Alves, Trabalho e subjetividade (Boitempo, 2011) já está à venda também em formato eletrônico (ebook) nas lojas da Gato Sabido e Livraria Cultura.

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Giovanni Alves é doutor em ciências sociais pela Unicamp, livre-docente em sociologia e professor da Unesp, campus de Marília. É pesquisador do CNPq com bolsa-produtividade em pesquisa e coordenador da Rede de Estudos do Trabalho (RET) e do Projeto Tela Crítica. É autor de vários livros e artigos sobre o tema trabalho e sociabilidade, entre os quais O novo (e precário) mundo do trabalho: reestruturação produtiva e crise do sindicalismo (Boitempo Editorial, 2000) e Trabalho e subjetividade: O espírito do toyotismo na era do capitalismo manipulatório (Boitempo Editorial, 2011). Colabora para o Blog da Boitempo mensalmente, às segundas.

ATENAS ARDE EM PROTESTOS CONTRA POLÍTICA DA “TROIKA”

 A Grécia viveu neste domingo os mais violentos protestos dos últimos meses contra as políticas impostas ao país pela chamada “troika” (Fundo Monetário Internacional, Banco Central Europeu e Comissão Europeia). Em meio a violentos protestos, o parlamento grego aprovou um novo “pacote de austeridade”, que resultará em milhares de demissões e cortes de gastos públicos. No início da noite, vários prédios históricos de Atenas estavam em chamas e os manifestantes enfrentavam a polícia com pedras e coqueteis molotov.

Dezenas de milhares de pessoas compareceram à maior manifestação em Atenas contra a austeridade e os cortes de gastos públicos aprovados neste domingo no parlamento grego. A multidão dispersou da Praça Syntagma quando a polícia a atacou com gás lacrimogêneo, mas muitos grupos permaneceram no centro de Atenas enfrentando a polícia com pedras e coqueteis molotov. 

Manolis Glezos, o herói da resistência grega ao nazismo e membro do Syriza, perguntava à imprensa “como é possível implementar estas medidas com gás lacrimogéneo?”. “Elas não têm o voto do povo grego”, acrescentou este militante de 90 anos, ainda com a máscara de gás colocada e dificuldade em respirar.

Outro veterano nesta manifestação contra o governo da troika foi o compositor Mikis Theodorakis. Foi quando se preparava para dirigir à multidão na Praça Syntagma que a polícia começou a disparar o gás lacrimogêneo. Aos microfones duma rádio grega, uma porta-voz de Theodorakis acusou a polícia de “tentativa de assassinato” por ter tentado deliberadamente atingir o compositor de 86 anos. Em declarações aos jornalistas, Theodorakis afirmou-se confiante que “o povo vencerá”, tal como aconteceu contra os nazis e a junta militar.

Todo o centro de Atenas ficou sob a nuvem do gás policial e os focos de incêndio estão também disseminados, com os confrontos sem fim à vista. Ao fim da tarde, estavam encerradas quatro estações de metrô no centro de Atenas por ordem da polícia. O líder sindical do metrô disse que os trabalhadores não viam razões para o encerramento e que a intenção da polícia era impedir as pessoas de chegarem à Praça. Entretanto, a outra manifestação da tarde, convocada pela central sindical PAME, dirigia-se para a Praça Syntagma.

Dentro do Parlamento, o debate teve início depois das 15h, com o ministro das Finanças tentando explicar aos deputados a pressa para aprovar a proposta até à meia noite de domingo. Um deputado independente questionou o parlamento sobre se tinha a certeza do que estava para ser votado, quando há várias falhas no documento, incluindo partes em que aparece “XX” em vez do número da quantia a que se refere.

O dia parlamentar também foi marcado pela tomada de posse de alguns deputados, em substituição daqueles que se demitiram em protesto contra o pacote de austeridade que vai reduzir o salário mínimo, despedir milhares de funcionários públicos e cortar ainda mais na Saúde e gastos sociais. Mas há casos em que o substituto, em vez de vir apoiar o governo cada vez mais frágil, toma posse para votar contra o seu partido. É o que acontece à atriz Anna Vagena, da lista do PASOK.

No sábado, era já conhecida a oposição de mais de dez deputados do PASOK, que se tem afundado nas sondagens nos últimos meses, e mesmo da Nova Democracia, incluindo o líder parlamentar e os deputados responsáveis pelos assuntos da Defesa e do Interior. A extrema-direita do LAOS, que retirou o apoio ao Governo de Lucas Papademos, também votará contra, à exceção dos seus antigos ministros.

Publicado originalmente em Carta Maior (Dom. 12.02.2012)

http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=19605

A REVOLTA DA BURGUESIA ASSALARIADA. Slavoj Žižek.

Recriação do jogo Monopoly instalada por Banksy no acampamento do Occupy London

Traduzido por Chrysantho Sholl e Fernando Marcelino.

Embora os protestos sociais em curso nos países ocidentais desenvolvidos pareçam indicar o renascimento de um movimento emancipatório radical, uma análise mais detalhada nos compele a elaborar uma série de distinções precisas que, de alguma forma, embaçam essa clara imagem. Três coisas caracterizam o capitalismo de hoje: a tendência de longo prazo de transformação do lucro em renda (em suas duas principais formas: a renda do “conhecimento comum” privatizado e a renda pelos recursos naturais); o papel estrutural mais forte do desemprego (a própria chance de ser “explorado” em um emprego duradouro é percebida como um privilégio); e a ascensão de uma nova classe que Jean-Claude Milner chama de “burguesia assalariada” [Veja Jean-Claude Milner, Clartes de tout, Paris, Verdier, 2011].

Para explicar a relação entre estas características, comecemos com Bill Gates: como ele se tornou o homem mais rico do mundo? Sua riqueza não tem nada a ver com o custo de produção daquilo que a Microsoft vende (pode-se até mesmo argumentar que a Microsoft paga a seus trabalhadores intelectuais um salário relativamente alto), isto é, a riqueza de Gates não é o resultado de seu sucesso em produzir bons softwares por preços mais baixos do que seus concorrentes ou por uma “maior exploração” de seus trabalhadores intelectuais contratados. Se este fosse o caso, a Microsoft teria ido a falência há muito tempo: as pessoas teriam optado massivamente por programas como Linux que são de graça e, de acordo com especialistas, de melhor qualidade que os programas da Microsoft. Por que, então, existem milhões de pessoas que ainda compram Microsoft? Porque a Microsoft se impôs como um padrão quase universal, “quase” monopolizando o setor, uma espécie de personificação direta daquilo que Marx chamou de General Intellect (Intelecto Coletivo), o conhecimento coletivo em todas as suas dimensões, da ciência ao prático know how. Gates se tornou o homem mais rico em algumas décadas através da apropriação da renda pela permissão de que milhões participem na forma do “intelecto coletivo” que ele privatizou e controla.

Deve-se transformar criticamente o aparato conceitual de Marx: por causa de sua negligência em relação à dimensão social do “intelecto coletivo”, Marx não vislumbrou a possibilidade de privatização do próprio “intelecto coletivo”. É isto que está no coração da luta contemporânea pela propriedade intelectual: a exploração tem cada vez mais a forma de renda, ou, como diz Carlo Vercellone, o capitalismo pós-industrial é caracterizado pelo “tornar-se renda do lucro” [Veja Capitalismo cognitivo, editado por Carlo Vercellone, Roma, manifestolibri, 2006]. Em outras palavras, quando, por conta do papel crucial do “intelecto coletivo” (conhecimento e cooperação social) na criação de riqueza, as formas de riqueza se tornam cada vez mais desproporcionais em relação ao tempo de trabalho diretamente empregado na produção, o resultado não é, como Marx parecia esperar, a autodissolução do capitalismo, mas a transformação gradual do lucro gerado pela exploração da força de trabalho em renda apropriada pela privatização do “intelecto coletivo”.    

O mesmo acontece com os recursos naturais: sua exploração é uma das maiores fontes de renda hoje, acompanhada da luta permanente pra saber quem ficará com esta renda – os povos do Terceiro Mundo ou as corporações ocidentais (a suprema ironia é que, para explicar a diferença entre força de trabalho – que, em seu uso, produz mais-valia sobre seu próprio valor – e outras mercadorias – que somente consomem seu próprio valor em seu uso e, portanto, não envolvem exploração -, Marx menciona como exemplo de uma mercadoria ordinária o petróleo, a própria mercadoria que hoje é a fonte de extraordinários “lucros”…). Aqui também não faz sentido vincular as altas e baixas do preço do petróleo com altos e baixos custos de produção ou preços do trabalho explorado – custos de produção são negligenciáveis, o preço que pagamos pelo petróleo é a renda que pagamos para os proprietários deste recurso por conta de sua escassez e oferta limitada.

A consequência deste crescimento na produtividade alavancado pelo impacto exponencialmente crescente do conhecimento coletivo é a transformação do papel do desemprego: embora o “desemprego seja estruturalmente inseparável da dinâmica de acumulação e expansão que constitui a própria natureza do capitalismo enquanto tal” [Fredric Jameson, em Representing Capital, Londres, Verso Books, 2011, p. 149], o desemprego adquiriu atualmente um papel qualitativamente diferente. Naquilo que, possivelmente, é o ponto extremo da “unidade dos opostos” na esfera da economia, é o próprio sucesso do capitalismo (crescimento produtivo etc.) que produz desemprego (produz mais e mais trabalhadores inúteis) – o que deveria ser uma benção (menos trabalho duro necessário) se torna uma sina. O mercado global é, assim, em relação a sua dinâmica imanente, “um espaço no qual todos já foram, um dia, trabalhadores produtivos, e no qual o trabalho, em todos os lugares, foi aos poucos retirando-se do sistema” [Fredric Jameson, em Valences of the Dialetic, Londres, Verso Books, 2009, p. 580-1]. Isso é, no atual processo de globalização capitalista, a categoria dos desempregados adquire uma nova qualidade além da clássica noção de “exército industrial de reserva”: devemos considerar em relação a categoria do desemprego “aquelas enormes populações, que ao redor do mundo foram ‘expulsas da história’, que foram deliberadamente excluídas dos projetos modernizadores do capitalismo de primeiro mundo e apagadas como casos terminais sem esperança” [Jameson, em Representing Capital, p. 149]: os assim chamados estados falidos (Congo, Somália), vítimas da fome ou de desastres ecológicos, presos a “rancores étnicos” pseudo-arcaicos, objetos da filantropia e das ONGs, ou (frequentemente os mesmos personagens) da “guerra contra o terror”. A categoria dos desempregados deve assim ser expandida para agregar uma população de largo alcance, dos temporariamente desempregados, passando pelos não mais empregáveis, até pessoas vivendo nas favelas e outras formas de guetos (todos aqueles desconsiderados pelo próprio Marx como “lúmpem-proletariado”) e, finalmente, áreas inteiras, populações ou estados excluídos do processo capitalista global, como os espaços em branco nos mapas antigos.

Mas esta nova forma de capitalismo não traz também uma nova perspectiva de emancipação? Nisto reside a tese de Hardt e Negri em Multidão: guerra e democracia na Era do Império [Rio de Janeiro: Record, 2005] onde eles pretendem radicalizar Marx, para quem o capitalismo corporativo altamente organizado já era uma forma de “socialismo dentro do capitalismo” (uma espécie de socialização do capitalismo, com os proprietários tornando-se cada vez mais supérfluos), de maneira que seria necessário apenas cortar a cabeça do proprietário nominal e nós teríamos socialismo. Para Hardt e Negri, entretanto, a limitação de Marx foi estar historicamente limitado ao trabalho industrial mecanicamente industrializado e hierarquicamente organizado, razão pela qual a sua visão de “intelecto coletivo” seria como uma agência central de planejamento; somente hoje, com a elevação do trabalho imaterial ao padrão hegemônico, a transformação revolucionária se torna “objetivamente possível”. Esse trabalho imaterial se desdobra entre dois pólos: trabalho (simbólico) intelectual (produção de ideias, códigos, textos, programas, figuras etc. por escritores, programadores…) e trabalho afetivo (aqueles que lidam com afecções corpóreas, de médicos a babás e aeromoças). O trabalho imaterial é hoje hegemônico no sentido preciso em que Marx proclamou que, no capitalismo do século XIX, a produção industrial em larga escala era hegemônica, como a cor específica dando o tom da totalidade – não quantitativamente, mas cumprido um papel chave, emblematicamente estrutural. Assim, o que surge é um inédito vasto domínio dos “comuns”: conhecimento compartilhado, formas de cooperação e comunicação etc. que não podem mais ser contidos na forma da propriedade privada – por quê? Na produção imaterial, os produtos já não são objetos materiais, mas novas relações sociais (interpessoais) – em suma, a produção imaterial já é diretamente biopolítica, produção de vida social.

A ironia é que Hardt e Negri se referem aqui ao próprio processo que os ideólogos do capitalismo “pós-moderno” celebram como a passagem da produção material para a simbólica, da lógica centralista-hierárquica para a lógica da autopóiese e da auto-organização, cooperação multi-centralizada etc. Negri é aqui efetivamente fiel a Marx: o que ele tenta provar é que Marx estava certo, que a ascensão do intelecto coletivo é, em longo prazo, incompatível com o capitalismo. Os ideólogos do capitalismo pós-moderno estão afirmando exatamente o oposto: é a teoria marxista (e sua prática) que permanecem dentro dos limites de uma lógica hierárquica e sob controle centralizado do Estado, e assim não conseguem lidar com os efeitos sociais da nova revolução informacional. Existem boas razões empíricas para esta afirmação: de novo, a suprema ironia da história é que a desintegração do Comunismo é o exemplo mais convincente da validade da tradicional dialética marxista entre forças produtivas e relações de produção com a qual o marxismo contou na sua tentativa de superar o capitalismo. O que arruinou efetivamente os regimes Comunistas foi sua inabilidade em acomodar-se à nova lógica social sustentada pela “revolução informacional”: eles tentaram dirigir esta revolução com um novo projeto de planejamento estatal centralizado de larga escala. O paradoxo, assim, é que aquilo que Negri celebra como chance única de superação do capitalismo, é exatamente o que os ideólogos da “revolução informacional” celebram como ascensão de um novo capitalismo “sem fricção”.

A análise de Hardt e Negri possui três pontos fracos que, em sua combinação, explicam como o capitalismo pode sobreviver ao que deveria ser (em termos marxistas clássicos) uma nova organização da produção que o tornaria obsoleto. Ela subestima a extensão do sucesso do capitalismo contemporâneo (pelo menos em curto prazo) de privatizar o “conhecimento comum”, assim como a extensão com que, mais do que a burguesia, são os próprios trabalhadores que se tornam “supérfluos” (número cada vez maior deles torna-se não somente desempregado, mas estruturalmente inempregável). Além disso, mesmo que seja verdade, em princípio, que a burguesia está progressivamente se tornando desfuncional, deve-se qualificar esta afirmação –  desfuncional para quem? Para o próprio capitalismo. Isto quer dizer que, se o velho capitalismo envolvia idealmente um empreendedor que investia dinheiro (seu ou emprestado) em produção organizada e dirigida por ele próprio, recolhendo o lucro, hoje está surgindo um novo tipo ideal: não mais o empreendedor que possui sua própria empresa, mas o gerente especialista (ou um conselho administrativo presidido por um CEO) de uma empresa de propriedade dos bancos (também dirigidos por gerentes que não possuem os bancos) ou investidores dispersos. Neste novo tipo ideal de capitalismo sem burguesia, a velha burguesia desfuncional é refuncionalizada como gerentes assalariados – a nova burguesia recebe cotas, e mesmo se ela possui uma parte na empresa, eles recebem as ações como parte da remuneração pelo trabalho (“bônus por sua gerência bem sucedida”).

Esta nova burguesia ainda se apropria da mais-valia, mas da forma mistificada daquilo que Milner chama de “mais-salário”: em geral, a eles é pago mais do que o salário mínimo do proletário (este ponto de referência imaginário – frequentemente mítico – cujo único verdadeiro exemplo na economia global de hoje é o salário de um trabalhador numa sweat-shop na China ou na Indonésia), e é esta diferença em relação aos proletários comuns, esta distinção, que determina seu status. A burguesia no sentido clássico, assim, tende a desaparecer. Os capitalistas reaparecem como um subconjunto dos trabalhadores assalariados – gerentes qualificados para ganhar mais por sua competência (razão pela qual a “avaliação” pseudo-científica que legitima os especialistas a ganharem mais é crucial hoje em dia). A categoria dos trabalhadores que recebem mais-salário não está, obviamente, limitada aos gerentes: ela se estende a todos os tipos de especialistas, administradores, funcionários públicos, médicos, advogados, jornalistas, intelectuais, artistas… O excesso que eles recebem tem duas formas: mais dinheiro (para gerentes etc.), mas também menos trabalho, isto é, mais tempo livre (para alguns intelectuais, mas também para setores da administração estatal).

O procedimento de avaliação que qualifica alguns trabalhadores para receberem mais-salário é, claramente, um mecanismo arbitrário de poder e ideologia sem nenhuma ligação séria com a competência real – ou, como diz Milner, a necessidade de mais-salário não é econômica, mas política: para manter uma “classe média” com o propósito de estabilidade social. A arbitrariedade da hierarquia social não é um erro, mas todo o seu propósito, de forma que a arbitrariedade da avaliação cumpre um papel homólogo à arbitrariedade do sucesso de mercado. Isto é, a violência ameaça explodir não quando existe muita contingência no espaço social, mas quando se tenta eliminar esta contingência. É neste nível que se deve buscar pelo que se pode chamar de, em termos um tanto vagos, a função social da hierarquia. Jean-Pierre Dupuy [em La marque du sacre, Paris, Carnets Nord, 2008] concebe a hierarquia como um dos quatro procedimentos (“dispositivos simbólicos”) cuja função é fazer com que a relação de superioridade não seja humilhante para os subordinados: ahierarquia (a ordem externamente imposta de papéis sociais em clara contraposição ao valor imanente dos indivíduos – eu, portanto, experimento meu menor status social como totalmente independente do meu valor intrínseco); a desmistificação (o procedimento crítico-ideológico que demonstra que as relações de superioridade/inferioridade não estão fundamentadas na meritocracia, mas são resultado de lutas objetivamente ideológicas e sociais: meu status social depende de processos sociais objetivos, não de méritos – como diz Dupuy sarcasticamente, a desmistificação social “cumpre o mesmo papel, em nossas sociedades igualitárias, competitivas e meritocráticas do que a hierarquia nas sociedades tradicionais” [p. 208] – isto nos permite evitar a conclusão dolorosa de que “a superioridade do outro é o resultado de seus méritos e conquistas”; a contingência (o mesmo mecanismo, porém sem a sua forma crítico-social: nossa posição em escala social depende de uma loteria natural e social – sortudos são aqueles que nascem com melhores disposições e em famílias ricas); a complexidade (superioridade ou inferioridade dependem de um processo social complexo independente das intenções ou méritos dos indivíduos – digamos, a mão invisível do mercado pode causar o meu fracasso ou o sucesso do meu vizinho, mesmo que eu tenha trabalhado muito mais e seja muito mais inteligente). Ao contrário do que parece, todos estes mecanismos não contestam ou sequer ameaçam a hierarquia, mas a tornam palatável, uma vez que “o que desencadeia o turbilhão da inveja é a ideia de que o outro merece a sua sorte e não a ideia oposta, a única que pode ser abertamente expressa” [p.211]. Dupuy extrai desta premissa a conclusão (óbvia, para ele) de que é um grande erro pensar que uma sociedade que seja justa e que se perceba como justa será assim livre de todo o ressentimento – ao contrário, é precisamente em tal sociedade que aqueles que ocupam posições inferiores encontraram uma válvula de escape para seu orgulho ferido em violentas explosões de ressentimento.

Aí reside um dos maiores impasses da China hoje: o objetivo ideal das reformas de Deng Xiaoping era introduzir um capitalismo sem burguesia (como classe dominante); agora, entretanto, os líderes chineses estão descobrindo dolorosamente que o capitalismo sem hierarquia estável (conduzida pela burguesia como nova classe) gera permanente instabilidade – portanto, que caminho tomará a China? Mais genericamente, esta é possivelmente a razão pela qual (ex-)comunistas reaparecem como os mais eficientes gestores do capitalismo: sua histórica inimizade com a burguesia enquanto classe se encaixa perfeitamente na tendência do capitalismo contemporâneo em direção a um capitalismo gerencial sem burguesia – em ambos os casos, como Stalin disse a muito tempo, “os quadros decidem tudo” (está surgindo também uma diferença interessante entre a China de hoje e a Rússia: na Rússia os quadros universitários eram ridiculamente mal pagos, eles de fato se confundiam com os proletários, enquanto na China eles são bem remunerados com um “mais-salário” como meio de garantir sua docilidade).                       

Além disso, esta noção de “mais-salário” também nos permite lançar novas luzes sobre os atuais protestos “anti-capitalistas”. Em tempos de crise, o candidato óbvio para “apertar os cintos” são os níveis mais baixos da burguesia assalariada: uma vez que o seu mais-salário não cumpre nenhum papel econômico imanente, a única coisa que permite diferenciá-los do proletariado são seus protestos políticos. Embora estes protestos sejam nominalmente dirigidos pela lógica brutal do mercado, eles efetivamente protestam contra a gradual corrosão de sua posição econômica (politicamente) privilegiada. Lembremos da fantasia ideológica favorita de Ayn Rand (de seu Atlas Shrugged), a de “criativos” capitalistas em greve – esta fantasia não encontra sua realização perversa nas greves de hoje, que em sua maioria são greves da privilegiada “burguesia assalariada” motivada pelo medo de perder seu privilégio (o excedente sobre o salário mínimo)? Não são protestos proletários, mas protestos contra a ameaça de ser reduzido à condição proletária. Isto quer dizer: quem ousa se manifestar hoje, quando ter um emprego permanente já se tornou um privilégio? Não os trabalhadores mal pagos (no que sobrou) da indústria têxtil etc. mas o estrato de trabalhadores privilegiados com empregos garantidos (muitos da administração estatal, como a polícia e os fiscais da lei, professores, trabalhadores do transporte público etc.). Isto também vale para a nova onda de protestos estudantis: sua maior motivação é o medo de que a educação superior não mais lhes garanta um mais-salário na vida futura.

Está claro, obviamente, que o enorme renascimento dos protestos no último ano, da Primavera Árabe ao Leste Europeu, do Occupy Wall Street à China, da Espanha à Grécia, não devem definitivamente ser desconsiderados como uma revolta da burguesia assalariada – eles guardam potenciais muito mais radicais, de forma que devemos nos engajar numa análise concreta caso a caso. Os protestos estudantis contra a reforma universitária em curso no Reino Unido são claramente opostos às barricadas do Reino Unido em agosto de 2011, este carnaval consumista de destruição, a verdadeira explosão dos excluídos. Em relação aos levantes do Egito, pode-se argumentar que, no começo, houve um momento de revolta da burguesia assalariada (jovens bem educados protestando contra a falta de perspectiva), mas isto foi parte de um amplo protesto contra um regime opressivo. Entretanto, até que ponto o protesto conseguiu mobilizar trabalhadores e camponeses pobres? Não seria a vitória eleitoral dos islâmicos também uma indicação da base social estreita do protesto secular original? A Grécia é um caso especial: nas últimas décadas surgiu uma nova “burguesia assalariada” (especialmente na administração estatal superdimensionada) graças à ajuda financeira e empréstimos da União Europeia, e muitos dos protestos atuais, mais uma vez, reagem à ameaça de perda destes privilégios.

Além disso, esta proletarização da baixa “burguesia assalariada” vem acompanhada do excesso oposto: as remunerações irracionalmente altas dos grandes executivos e banqueiros (remunerações economicamente irracionais, uma vez que, como demonstraram as investigações nos Estados Unidos, elas tendem a ser inversamente proporcionais ao sucesso da empresa). É verdade, parte do preço pago por essa super remuneração é o fato dos executivos ficarem totalmente disponíveis 24 horas por dia, vivendo assim num estado de emergência permanente. Mais do que submeter estas tendências a uma crítica moralista, deveríamos interpretá-las como a indicação de como o próprio sistema capitalista não é mais capaz de encontrar um nível interno de estabilidade autorregulada e de como esta circulação ameaça sair do controle.

Publicado no Blog da Boitempo Editorial

http://boitempoeditorial.wordpress.com/2012/01/27/a-revolta-da-burguesia-assalariada/

A CRISE NA ERA SENIL DO CAPITALISMO. Jorge Beinstein

Incerteza 

Incerteza é a palavra que melhor define o clima psicológico actual. Todos os precedentes capitalistas desta crise demonstraram-se imprestáveis na hora de entender o que está a acontecer. A imagem da “terra incógnita”, da entrada num território desconhecido vai-se impondo entre as elites das grandes potências. Num artigo recente aparecido em The Independent, Jeremy Walker resume bastante bem esta nova percepção: “Encontramo-nos num mar desconhecido, ninguém sabe para onde vamos. A única coisa que sabemos é que a tormenta económica prossegue a sua marcha” [1] .

Por sua vez, James Rickards, uma figura chave do aparelho de inteligência estado-unidense (formalmente é assessor financeiro do gabinete do secretário da Defesa) apresentou em 17 de Dezembro de 2008 um relatório auspiciado pela U.S. Navy onde traça quatro cenários catastróficos sobre o futuro dos Estados Unidos. Um (como não podia deixar de ser na era Bush) a descrever um mega ataque terrorista que se aproveitaria da extrema debilidade da economia para assestar um golpe mortal no Império. Outro, centrado numa suposta agressão financeira da China a vender maciçamente no mercado dólares e títulos públicos estado-unidenses provocando assim o derrube das suas cotações. Um terceiro cenário apresenta a queda livre do dólar e as consequências desastrosas para a sociedade imperial e o resto do mundo. E finalmente um quarto cenário, talvez o mais importante, denominado “Derrube existencial”, que prognostica uma depressão prolongada com redução do Produto Interno Bruto da ordem dos 35% ao longo dos próximos 6 ou 7 anos, com uma taxa de desemprego que logo chegaria aos 15%, etc. [2]

A ilusão da auto-regulação do mercado financeiro esfumou-se. Os gurús da especulação ocultaram-se ou mudaram de discurso procurando outros deuses: os da intervenção estatal, os quais há umas poucas décadas haviam lançado no baú dos velhos objectos inúteis. Nos fins de 2008 numerosas revistas especializadas de todos os continentes, algumas destinadas ao grande público, mostravam a fotografia de lord Keynes desenterrado para salvar-nos do desastre. Mas até agora a nova-velha magia intervencionista demonstrou a mais completa impotência. Vários milhões de milhões de dólares, euros e outras moedas fortes (fortes?) foram lançados no mercado em espectaculares operações de salvamento com resultado nulo. O mercado não se auto-regula, mas tão pouco aceita ser regulado. Uma avalanche de acontecimentos sepultou por completo os prognósticos conservadores dos triunfadores da Guerra Fria. O futuro já não será mais-do-mesmo e ao fundir-se essa linearidade burguesa da história ressurge com uma força inusitada, o que Mircea Eliade denominava “o terror da história”. Neste caso, diante de uma provável sucessão de factos em que os poderes e valores dominantes não sejam respeitados, ultrapassados por forças hostis. É no seio das classes dominantes que esse terror cresce velozmente. 

Figura 1.A crise financeira é gigantesca, mas também o são as “outras crises”, umas mais visíveis ou virulentas que outras a convergirem até formar um fenómeno inédito. Para tomar um só exemplo, a crise energética que se exprime por agora no estancamento e na próxima redução da produção petrolífera global, foi até há pouco um catalisador decisivo da especulação e da inflação (até antes da queda económica do último trimestre de 2008) e aguarda-nos num futuro não muito longínquo para assestar-nos novos golpes inflacionários, quando a extracção descer mais alguns degraus ou quando a depressão económica se detiver. Por outro lado, a crise energética está associada à crise alimentar e ambas assinalam a existência de um impasse tecnológico geral que se estende ao meio ambiente e ao aparelho militar-industrial, tudo isso concentrado e exacerbado a partir do colapso financeiro nos Estados Unidos, o centro do mundo. 

É possível afirmar que as diversas crises não são senão aspectos de uma única crise, sistémica, do capitalismo como etapa da história humana. [3]

Ciclos 

Um componente importante dessa crise psicológica é a constatação de que certos ciclos que pareciam reger o funcionamento económico deixaram de funcionar. Trata-se da destruição da crença em que após um determinado número de meses ou de anos de vacas magras chegaria o das vacas gordas e que o sistema continuaria o seu caminho ascendente. 

Gráfico 2.Os ciclos decenais descobertos por Juglar por volta de 1860 atravessaram boa parte do século XIX exprimindo as oscilações do jovem capitalismo industrial, ainda que no fim do mesmo essas rotinas tenham-se tornado opacas. Por volta de 1885, numa nota anexa ao Livro III do Capital, Engels assinalava que “se verificou uma viragem desde a última grande crise geral (1867). A forma aguda do processo periódico com o seu ciclo de dez anos que se vinha observando até então parece haver cedido o lugar a uma sucessão antes crónica e longa de períodos relativamente curto e ténues de melhoria dos negócios e períodos longos de depressão…”. E atribuía essa mudança à nova configuração económica internacional marcada pelo desenvolvimento rápido dos meios de comunicação, pela ampliação do mercado mundial e pelo fim do monopólio industrial inglês [4] . Os velhos ciclos decenais tendiam a desaparecer porque o capitalismo havia sofrido mudanças estruturais decisivas. 

Mas isso não afectou outras rotinas do sistema, como as ondas longas de Kondratieff, etapa de aproximadamente entre 50 e 60 anos [N.T.] (a primeira metade de ascensão económica e a segunda de descida) que se vinham sucedendo a partir da revolução industrial inglesa. Ao longo da história do capitalismo foram registados quatro ciclos de Kondratieff. O primeiro iniciou-se em fins do século XVIII e concluiu-se em meados do século XIX. O segundo terminou durante a última década desse século e o terceiro durante os anos 1940 quando se iniciou um quarto ciclo, cuja etapa de prosperidade chegou até fins dos anos 1960, até 1968 se acompanharmos a proposta de Mandel que prefere estabelecer cortes históricos precisos [5] . A partir desse momento a taxa de crescimento da economia mundial impulsionada pelos países capitalistas centrais descreveu uma tendência descendente no longo prazo que não se deteve até hoje e que deveria prolongar-se num futuro previsível (ver Gráfico 2). 

Se aceitarmos a periodização de Mandel, a fase descendente do primeiro Kondratieff teria durado uns 22 anos, a do segundo 20 anos e a do terceiro 26 anos. A média é de aproximadamente 22,6 anos, mas a descida do quarto Kondratieff já estaria a durar uns 40 anos (em 2008) e não é demasiado ousado prever o seu prolongamento pelo menos um lustro mais. Seguindo o modelo teórico, a recuperação deveria ter começado em meados da década passada. Isso não se verificou e tão pouco aconteceu na actual (ver Gráfico 3) 

Gráfico 3.

Pior ainda, cada fase ascendente costuma ser associada às grandes inovações tecnológicas que modificaram os sistemas de produção e os estilos de consumo. Assim aconteceu durante a primeira revolução industrial com a máquina a vapor e a expansão da indústria têxtil, em meados do século XIX com o aço e o desenvolvimento das ferrovias, em fins do século XIX com a electricidade, a química e os motores, e em meados dos anos 1940 com a electrónica, a petroquímica e os automóveis no arranque do quarto Kondratieff. Assim “devia ter sucedido” na década dos anos 1990, atravessada por grandes inovações na informática, biotecnologia e novos materiais. Contudo, essas mudanças técnicas não modificaram positivamente o curso dos acontecimentos. Ao contrário, acentuaram as suas piores características. A informática por exemplo:   quando avaliamos o seu impacto segundo a importância da actividade económica envolvida constatamos que a sua principal aplicação se verificou na área do parasitismo financeiro, cujo volume de negócios (uns mil milhões de milhões de dólares) equivale actualmente a cerca de 19 vezes o Produto Mundial Bruto. 

Isto permite-me colocar a hipótese de que assim como ocorreu há cerca de um século com os ciclos decenais de Juglar podemos actualmente sustentar que as ondas longas de Kondratieff perderam a sua validade científica. A fase descendente do quatro Kondratieff foi triturada pela nova realidade. A economia mundial completamente hegemonizada pelo parasitismo financeiro obedece a uma dinâmica radicalmente diferente da que vigorou durante a era do capitalismo industrial. 

Frente a essa evidência não faltam peritos e académicos desejosos de encontrar uma nova rotina restauradora da ordem. Alguns propõem regressar a ciclos mais curtos e violentos estilo Juglar (retorno ao século XIX?), outros misturam Juglar e Kondratieff introduzindo alguns adornos provenientes da psicologia social, outros realizam manipulações econométricas no ciclo Kondratieff conservando assim a esperança numa futura recomposição ascendente do sistema. É o caso de Ian Gordon, renomado especialista norte-americano em prognósticos económicos que não tem dúvida em fabricar um super “quarto Kondratieff” estado-unidense de quase 70 anos, correndo para a direita o início da sua etapa ascendente (desde 1940 a 1950) estendendo-a até os anos 1980 e propor o fim do descida (e o começo de um novo e maravilhoso quinto Kondratieff caitalista) para fins da segunda década do século XXI [6] .

Senilidade 

O fim das rotinas e a entrada num tempo de desordem geral estão assinalar-nos que o mundo burguês não se encontra perante uma enfermidade passageira, uma “crise cíclica” mais no interior do grande ciclo, único e supostamente vigoroso do capitalismo e sim perante uma crise de enorme amplitude onde as enfermidades multiplicam-se não por um capricho do destino e sim porque o organismo, o sistema social universal, está muito velho. 

O capitalismo mundial entrou na etapa senil [7] no anos 1970 quando o parasitismo se tornou hegemónico. Ao longo da referida década e do primeiro lustro dos anos 1980 ocorreram factos decisivos nos Estados Unidos, dentre eles o princípio do declínio da produção petrolífera, a decisão do governo Nixon de acabar com o padrão dólar-ouro, a derrota no Vietname a que a seguir acrescentaram-se os défices comerciais e fiscais crónicos e a subida incessante das dívidas pública e privada, a concentração de rendimentos, o consumismo, a elitização e degradação do sistema político, etc. 

Tudo isso redundou, nos princípios do século XXI, quando se desinchou a bolha bursátil, numa situação extremamente grave à qual o Império respondeu com uma desesperada fuga para a frente: radicalizou a sua estratégia de conquista da Eurásia desenvolvendo grandes operações militares (Iraque, Afeganistão) e reanimou a especulação financeira inchando a bolha imobiliária e, graças a ela, voltando a inchar a bolha bursátil. Perante a crise do parasitismo financeiro decidiu impulsionar um onda parasitária muito maior que a anterior. Não se tratou de um “erro estratégico”e sim uma consequência estratégica lógica inscrita na dinâmica dominante do sistema de poder. 

Um primeiro indicador de senilidade é a decadência dos Estados Unidos, resultado de um longo processo de degradação. A “globalização”desenvolvida desde os anos 1970 implicou um triplo processo: o aburguesamento quase completo do planeta (a cultura do capitalismo tornou-se verdadeiramente universal ao derrotar a URSS e integrar a China), a financiarização integral do capitalismo (hegemonia parasitária) e a unipolaridade, a instalação do Império norte-americano como poder supremo mundial. É o principal consumidor global e área central dos negócios financeiros internacionais ao que se acrescenta o facto decisivo da “norte-americanização” da cultura das classes dominantes do mundo. É por isso que o declínio (senilidade) dos Estados Unidos, para além das suas consequências económicas (ou incluindo suas consequências económicas) constitui o motor da decadência universal do capitalismo. 

O Império foi em simultâneo verdugo e vítima do resto do mundo. O seu consumismo parasitário teve como contrapartida os bons negócios comerciais e financeiros das burguesias da União Europeia, China, Japão, Índia, etc. O inchaço parasitário estado-unidense foi o amortecedor fundamental da crise de superprodução crónica das grandes potências, mas a bolha imperial agora está a desinchar e o capitalismo global entra na depressão. 

Um segundo indicador de senilidade é a interacção entre dois fenómenos: a hipertrofia financeira global e a desaceleração no longo prazo da economia mundial (ver o Gráfico 2). Em princípios do século XXI chegámos à financiarização integral do capitalismo. As tramas especulativas impuseram sua “cultura” curtoprazista e depredadora que passou a ser o núcleo central da modernidade. Presenciamos um círculo vicioso. A crise crónica de superprodução iniciada há quatro décadas comprimiu o crescimento económico desviando excedentes financeiros para a especulação, cujo ascensão operou como um mega aspirados de fundos retirados ao investimento produtivo. Hoje a massa financeira mundial estaria a chegar aos mil milhões de milhões (10 15 ) dólares (só as operações com produtos financeiros derivados registadas pelo Banco da Basileia superam os 600 milhões de milhões de dólares. 

A economia mundial cresce cada vez menos. Além disso enfrenta um tecto energético que bloqueia o seu desenvolvimento, o que nos sugere o tema da crise energética, ou seja, da incapacidade tecnológica do sistema para superar a armadilha do esgotamento dos recursos naturais não renováveis. Não esqueçamos que o capitalismo industrial pôde alçar voo a partir dos fins do século XVIII porque conseguiu tornar-se independente dos recursos energéticos renováveis que o submetiam aos seus ritmos de reprodução e impor a sua lógica aos recursos não renováveis: o carvão, seguido mais adiante pelo petróleo. Essa proeza depredadora (que nos levou ao desastre actual) foi um pilar decisivo da construção do seu sistema tecnológico articulador de complexa e evolutiva rede de procedimentos produtivos, produtos, matérias-primas, hábitos de consumo, etc, enlaçando o desenvolvimento científico e as estruturas de poder. 

A crise energética está associada à crise alimentar, à qual deveríamos acrescentar a crise ambiental, para revelar um terceiro indicador de senilidade: o bloqueio tecnológico. É útil o conceito de limite estrutural do sistema tecnológico, definido por Bertrand Gille como o ponto no qual o referido sistema é incapaz de aumentar a produção a um ritmo que permita satisfazer necessidades humanas crescentes [8] . Não se trata de necessidades humanas em geral, ahistóricas, e sim de exigências sociais historicamente determinadas. É possível assim formular a hipótese de que o sistema tecnológico do capitalismo estaria a chegar ao seu limite superior para além do qual vai deixando de ser o pilar decisivo do desenvolvimento das forças produtivas para converter-se na ponta de lança da sua destruição. 

O capitalismo está agora a gerar um enorme desastre ecológico, resultado de uma rigidez civilizacional decisiva que o impede de superar uma dinâmica tecnológica que conduz à depredação catastrófica do meio ambiente. Cada vez que isso ocorreu no passado pré-capitalista foi porque a civilização que engendrou o referido sistema técnico havia chegado à sua etapa senil (a destruição do meio ambiente é na realidade auto-destruição do sistema social existente). 

Um quarto indicador de senilidade é a degradação estatal-militar, posta em evidência pelo fracasso da aventura dos falcões norte-americanos mas que exprime uma realidade global. O Estado intervencionista permitiu controlar as crises capitalistas verificadas desde os princípios do século XX, sua ascensão esteve sempre associada à do militarismo, às vezes de maneira visível e outras, após a Segunda Guerra Mundial, sob disfarce democrático (se observarmos a evolução dos Estados Unidos desde os anos 1930 comprovaremos que o “keynesianismo militar” constituiu até hoje a espinha dorsal do seu sistema). 

Mas finalmente o desenvolvimento das forças produtivas universais, até chegar à sua actual degeneração parasitária-financeira, acabou por ultrpassar os seus reguladores estatais submergindo-os na maior das suas crises. O neoliberalismo aparentou ser a expressão de uma globalização superadora dos estreitos capitalismos nacionais. Na realidade tratava-se do vigoroso monstro financeiro a devorar o seu pai estatal-produtivo-keynesiano. Agora, encurralados pela crise, os dirigentes das grandes potências retornam ao intervencionismo estatal que resulta ser impotente perante a maré financeira. 

Esta decadência estatal inclui a do militarismo moderno evidenciado pelo atolamento militar do Império no Iraque e do conjunto do Ocidente no Afeganistão. Trata-se de um fenómeno duplo. Por um lado, a ineficácia técnica desses super aparelhos militares para ganhar as guerras coloniais. Por outro, o seu gigantismo parasitário a operar como acelerados da crise. O caso norte-americano é exemplar (e sobre determinante): a hipertrofia bélica surge como um factor decisivo para os défices fiscais e a corrupção generalizada do Estado. 

Um quinto indicador de senilidade é a crise urbana desencadeada na era neoliberal e que se agravará exponencialmente ao ritmo da crise actual. Desde princípios dos anos 1980, quando o desemprego e o emprego precário nos países centrais tornaram-se crónicos e quando a exclusão e a pobreza urbana expandiu-se na periferia, o crescimento das grandes cidades foi cada vez mais o equivalente de involução das condições de vida das maiorias. A decomposição das cidades é claramente visível na periferia, mas não é exclusividade sua. Trata-se de um fenómeno global ainda que seja no mundo subdesenvolvido que se sucedam os primeiros colapsos, expressões mais agudas de uma onda multiforme, irresistível. 

Crise 

Desde a sua origem o capitalismo industrial experimentou uma longa sucessão de crises de superprodução. No século XIX tratou-se de crises cíclicas de crescimento uma civilização jovem. Após cada grande turbulência o sistema expandia-se, mas deixando sequelas negativas que se foram acumulando até finalmente engendrar uma força parasitária-financeira que nos princípios do século XX tornou-se dominante. Nesse momento o capitalismo entrou na sua era de “maturidade”. A intervenção estatal junto aos parasitismos militar e financeiro conseguiu controlar as crises, das quais emergiram fenómenos de decadência que deram um salto qualitativo ao desencadear da crise de superprodução dos fins dos anos 1960. Esta última foi amortecida, o sistema global continuou a crescer mas sobre a base da expansão exponencial da depredação ambiental e do parasitismo, principalmente financeiro. Este passou a controlar por completo o conjunto do mundo burguês, inaugurando a era senil do capitalismo. 

Neste novo contexto foi-se preparando a grande explosão que hoje presenciamos, cujo disparador foi o colapso financeiro de 2008. A partir do mesmo o capital global vai passando (rapidamente) da condição de um sistema velho a crescer cada vez menos e com maiores custos sociais para se tornar abertamente uma força destruidora das forças produtivas e do seu contexto ambiental (da “destruição criadora” schumpeteriana do século XIX à destruição depredadora do século XXI). 

As civilizações anteriores ao capitalismo não liquidadas por factores exógenos (invasões, catástrofes naturais, etc) foram-no por devastadoras e prolongadas crises de sub-produção em que a sua rigidez técnica (produto do envelhecimento cultural) bloqueava o desenvolvimento produtivo e desencadeava uma catástrofe ecológica. O motor dessas tragédias foi sempre o predomínio paralisante do parasitismo acumulado durante o longo ciclo civilizacional. 

A burguesia proclamava haver terminado com as crises sub-produção das antigas civilizações graças ao excepcional dinamismo tecnológico do sistema, o qual só podia sofrer crises de super-produção – sempre controladas graças ao crescente refinamento dos seus instrumentos de intervenção (que o neoliberalismo não eliminou e sim potenciou ao pô-los ao serviço da depredação financeira). Ridicularizavam os catastrofistas, especialmente os marxistas, que aguardavam a crise geral e final de superprodução que nunca chegou. Contudo, as referidas crises foram acumulando um potencial parasitário que agora começa a gerar uma crise de superprodução planetária, a maior da história humana. Se neste caso quiséssemos continuar a utilizar o conceito de crise cíclica, teríamos de fazê-lo com referência ao ciclo quase bicentenário do capitalismo — que acaba de entrar no período de aceleração da senilidade, de multiplicação de enfermidades e de colapsos. 

Quatro esperas inúteis 

Tendo presente este contexto de crise sistémica, civilizacional, que fazer referência a quatro esperas inúteis que florescem nos círculos de poder e nas suas periferias cortesãs. 

A primeira delas, que sobre determina as outras três, é a da chegada de um quinto ciclo de Kondratieff, de uma nova prosperidade produtiva do capitalismo, aguardado durante a década passada e a actual. Não pode chegar porque a estrutura económica que engendrava esse tipo de ciclos no passado desapareceu vítima do parasitismo financeiro. 

A segunda refere-se à chegada milagrosa de um novo keynesianismo que, empunhando a espada do intervencionismo estatal, cortaria a cabeça aos malvados especuladores financeiros e instalaria no centro do palco os bons capitalistas produtivos. O novo herói keynesiano não chegará porque o seu instrumento decisivo, o Estado, é impotente frente à maré financeira e muito mais ainda frente ao oceano da crise sistémica, além de a longa festa neoliberal tê-lo degradado profundamente. Por outro lado os bons capitalistas produtivos não aparecem em lado nenhum, o que realmente aparecem por todos os lados são os génios da especulação financeira. 

A terceira espera inútil é a do renascimento do Império depois de quase quatro décadas de decadência, sobrecarregado de dívidas, enlouquecido pelo consumismo, com uma cultura produtiva seriamente deteriorada. Não existe nenhum indício sério desse suposto renascimento. 

Finalmente, a quarta espera inútil é a de um novo Império capitalista ou uma nova aliança imperial, um novo centro do mundo burguês. A junção total entre as grandes potências descarta totalmente essa expectativa (a referida junção é o resultado de um longo processo de integração que acabou por conformar um sistema global fortemente inter-relacionado).

Notas 
(1), DeDefensa.org, 17/12/2008 – Faits et comentaires- “Notre temps de la Terra Incognita” ( www.dedefensa.org ).
(2) Eamon Javers, “Four really, really bad scenarios”, Politico.com, 17 de diciembre de 2008, ( www.politico.com/news/stories/1208/16663.html ).
(3), Jorge Beinstein, “Los rostros de la crisis. Reflexiones sobre el colapso de la civilización burguesa”, Rebelión: http://www.rebelion.org/docs/75463.pdf ,
Espai Marx: www.moviments.net/espaimarx
(4), Carlos Marx, “El Capital”, Libro III, Capítulo 30, nota 3, páginas 458 e 459, Fondo de Cultura Económica, México, D.F, 1966.
(5) Ernest Mandel, “Las ondas largas del desarrollo capitalista”, Ediciones Siglo XXI de España, Madrid, 1986.
(6) Ian Gordon, The Long Wave Analyst ( http://www.thelongwaveanalyst.ca/cycle.html ).
(7) O conceito de capitalismo senil foi elaborado nos anos 1970 por Roger Dangeville (Roger Dangeville, “Marx-Engels. La crise”, editions 10/18, Paris 1978) e retomado por vários autores na presente década (Jorge Beinstein, “Capitalismo Senil”, Edições Record, Rio de Janeiro, 2001), Samir Amin , “Au delà du capitalisme senile”, Actuel Marx -PUF, Paris 2002).
(8) “Histoire des techniques”, sous la direction de Bartrand Gille, La Pléiade, Paris, 1978.

[N.T.] Pode-se discutir a existência real dos referidos Ciclos de Kondratieff e a sua validade científica. Muitos consideram que tal teorização é sobretudo especulação. Grande parte dos economistas marxistas nega a existência de ciclos de Kondratieff. 

[*] Economista, argentino.

O original encontra-se em El Viejo Topo, Barcelona, n° 253, Fevereiro 2009

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